Mangue.Bit: um passo à frente e não estamos mais no mesmo lugar

Quase duas centenas de pessoas passaram o dia ontem dentro de um auditório perto de uma praia, de um rio e de um mangue. O foco? Startups pernambucanas e o software escalável e potencialmente global que estão desenvolvendo.

Ontem foi dia do Mangue.Bit - Ano 1, promovido pelo MANGUEZAL, com o patrocínio de 11 empresas, incluindo a Jump, Porto DigitalIkewai. Gringos e nativos, gente de muito lugar esteve por lá.

O dia foi dividido em investidores falando para empreendedores (manhã) e empreendedores falando para investidores (tarde). Durante a manhã, a discussão respondeu a 3 perguntas-chave:

  • existe capital para bons projetos? 
  • existem bons projetos para o capital que existe? 
  • como as startups devem fazer suas escolhas entre os caminhos de funding disponíveis - dos próprios recursos e/ou da família/amigos até os recursos de investidores-anjo, super anjos, capitalistas de risco e fundos de investimento? 
BNB apresentou o FNE Inovação e o cartão FNE e o BNDES falou sobre o cartão BNDES e os fundos da série CriatecCriatec 2 e Criatec 3. A Bozano Simonsen explicou que fica confortável para investir se vê que a startup tem uma equipe competente/dedicada/alinhada, um fluxo de caixa satisfatório e uma boa estratégia de saída (existência de possíveis compradores). E a Ikewai, direta e objetiva como seus sócios, deixou claro que não investe em startup de sócio único, que fatura menos de R$ 500 mil e que não conhece muito bem o seu mercado-alvo. Perguntas e respostas seguras, "na lata, feito caldo de cana-de-cana", como dizem os locais.

Uma mesa-redonda com investidores e investidos fechou a manhã. A conclusão? "Dinheiro evapora sem gestão." Mensagem dada e recebida.

A tarde seria tomada por apresentações "sensacionais!", como resumiria o ótimo Hiro Miyakawa, misto de mestre de cerimônias, apresentador do evento e breve reencarnação do nosso querido Chico Science.

Ed Dantas (Cesar Labs) lembrou-nos que instituições mantêm o foco no desempenho e deveriam apoiar os empreendedores inovadores que surgem em seus ecossistemas locais. "Manguezal existe em todo o mundo, maré subindo ou descendo. A inovação precisa colocar o pé na rua, encontrar e manter portas abertas. Os portos que vieram antes são alimentadores, criam pontes para os empreendedores, com possibilidades de longo prazo."

Brian Requarth (Viva Real) veio em seguida, muito simpático, falando sobre seu plano AAB (All About Brazil), os contatos telefônicos em momentos de guerra e a estratégia de funding com investidores como Dropbox e Airbnb. Compartilhou conosco as 5 lições que aprendeu desde que deixou a California, casou na Colômbia e chegou ao Brasil:

  • dinheiro não é tudo: há um momento certo para se ganhar dinheiro
  • é necessário ser muito persistente e até louco 
  • é essencial que a cultura e o propósito da empresa sejam continuamente compartilhados com a equipe
  • os sócios precisam ter convicção, mas não podem ter o ego elevado (para escalar, é necessário ter um time de primeira, sim!)
  • é focar... ou falhar... (defina as prioridades e mantenha seu foco)

Romero Rodrigues (Buscapé) historiou e defendeu "o poder ao consumidor" através da cultura (comunicação, respeito, transparência e exemplo), talento (autonomia, maestria/troca de aprendizado e propósito) e inovação. Antes um empreendedor, hoje um investidor, deixou 2 recados para a audiência:

  • é hora da startup educar o cliente ao invés de fazer marketing
  • crise é bom momento para a gente, "não desperdicem esta crise"
Rodrigo Cartaxo (Sympla) falou da importância de fazer parte de um ecossistema denso, ativo e conectado e sugeriu que as startups sempre verificassem antes com startups já incubadas ou aceleradas o que acham de onde estão.

Felipe Matos (Startup Farm) sugeriu que o Governo saia dos escritórios e converse com os empreendedores e lamentou que ego e competição afetem diálogos. Citou Waterloo, no Canadá, como exemplo de ecossistema e de diálogo entre governo, academia, capital, setor privado e startups.

André Ferraz (In Loco Media) focou o terceiro estágio da computação: as pessoas, depois dos PCs (2o. estágio), depois dos mainframes (1o. estágio). A startup pernambucana desenvolveu uma plataforma de software que permite a localização e o fluxo de pessoas "indoors", algo antes quase impossível de acontecer via GPS. Alternativa havia? Sim se integrada a hardware (como o iBeacon, da Apple), mas não exclusivamente com software. Em 15 meses, a In Loco Media controla esta conexão, apresenta casos de sucesso com grandes empresas e tem um plano audacioso de metas para o seu negócio altamente escalável. E, exemplar, não abre mão dos seus valores:

  • paixão
  • somos donos
  • velocidade é tudo
  • somos um time
  • fugimos do óbvio
Depois da apresentação de André, assistimos a apresentações de 13 empresários que responderam a perguntas de mais de uma dezena de investidores. O formato do pitch foi excelente: 5 minutos para as apresentações e 1 minuto para as respostas. Claras se tornaram as preferências.

O evento foi finalizado com uma palestra de Silvio Meira. Que privilégio tem o Recife por ter Silvio aqui, ativo, presente e envolvido, inspirando e inspirado com o ecossistema. Já ouvi Silvio dezenas de vezes e aprendo algo em cada uma delas. De ontem, trago algumas:
  • "inovação é mudança de comportamento de agentes no mercado, como fornecedores e consumidores" (Peter Drucker)
  • o maior impacto está nos modelos de negócios [baseados em software], intensivos em dados e leves em capital
  • como a inovação muda o mercado e os perfis de risco?
  • bastam 2 níveis hierárquicos, como na Intel: o de diretores e o de engenheiros
  • queremos líderes de capital humano
  • mudanças são feitas por startups - que criam, descobrem e resolvem problemas
Já eram 21h30, 12 horas e meia desde o início do evento, e o momento foi de abraçar e parabenizar os organizadores, palestrantes, empreendedores e investidores. Missão cumprida, com louvor!

Saí pensando no tanto que ouvi. Claro que há muito "não" ouvido, muito chão percorrido, muito dinheiro perdido, muito erro acontecido no caminho de cada um. Brian ouviu "não" 40 vezes e chegou a vender a casa para investir no negócio. Romero chegou a ser ameaçado de ser processado, 2 vezes, pelo mesmo cliente. Todos não dormiram em algum momento por não saberem o que fazer. Mas, apesar das circunstâncias, apesar das dificuldades que vêem e vão, sente-se uma certeza absurda e misteriosa no meio da toda aquela incerteza e circunstância. Este é o famoso "gut", está nas vísceras. Sente?

Sim, Chico Science. Um passo à frente e não estamos mais no mesmo lugar. Nunca mais.